É muito comum os professores ouvirem de seus alunos, por exemplo, a seguinte pergunta: “Onde eu irei usar isso na minha vida?”. E uma resposta meramente teórica não atende ao anseio desses alunos.
Não é de hoje que os dados estatísticos têm revelado a crescente e preocupante evasão dos estudantes de Ensino Médio nas escolas brasileiras. Pesquisas realizadas em 2009 indicam que a proporção de alunos fora da escola aumenta na medida em que aumenta a idade dos estudantes. Atualmente, no ensino médio, temos apenas 53% dos alunos frequentando escolas.
A justificativa levantada por mais de 40% dos jovens que abandonaram as salas de aulas refere-se à falta de interesse nos estudos. Segundo eles, o que se aprende na escola não faz sentido fora dela.
Fazer com que a escola seja um lugar mais acolhedor e interessante para os jovens passou a ser um grande desafio, diante deste anseio de compatibilizar o estudo das disciplinas com os objetivos futuros de cada aluno.
Em 2016, porém, foi aprovada a reforma do Ensino Médio, que flexibilizou e ampliou as possibilidades de currículo ofertadas pelas escolas. Com esse novo modelo, as escolas passaram a dividir a sua matriz curricular entre Formação Geral Básica e Itinerários Formativos.
Entendemos a Formação Geral Básica (FGB) como sendo a parte fixa do currículo, composta pelas disciplinas obrigatórias para todas as escolas do Brasil. A FGB hoje deve corresponder, no máximo, a 1.800 horas da carga horária total do novo Ensino Médio.
De outro lado, os Itinerários Formativos, parte flexível da matriz curricular do Novo Ensino Médio, compreendem o mínimo de 1.200 horas desta carga horária total e referem-se, por lei, ao conjunto de unidades curriculares a serem ofertadas pelas instituições de ensino, a fim de possibilitar ao aluno a ampliação e o aprofundamento de seus estudos, de acordo com o seu interesse, em uma das seguintes áreas do conhecimento: Linguagens e suas Tecnologias, Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias ou Ciências Humanas e Sociais.
Contudo, para colocar em prática o que a legislação brasileira determina, é necessário refletir sobre o conceito de “unidades curriculares”. Pela descrição legal, as unidades curriculares, que contam com carga horária pré-definida, podem vir a ser organizadas em disciplinas, módulos, projetos, oficinas, núcleos de estudos, dentre outras formas. E o seu objetivo é fazer com o que o estudante amplie, aprofunde e desenvolva competências específicas nas áreas do conhecimento de seu interesse.
Assim sendo, os Itinerários Formativos referem-se, portanto, aos momentos em que a escola poderá dar vida às disciplinas.
É muito comum os professores ouvirem de seus alunos, por exemplo, a seguinte pergunta: “Onde eu irei usar isso na minha vida?”. E uma resposta meramente teórica não atende ao anseio desses alunos. Mas temos agora, através dos Itinerários, a grande oportunidade de conciliar o conteúdo teórico com a vida prática, na área de interesse do aluno.
Os Itinerários, assim, devem ser pensados de maneira a fazer com que a teoria faça sentido na vida do aluno, permitindo-o interpretar os fatos da vida real com uma maior senso crítico e criatividade.
A escola poderá organizar os Itinerários Formativos com base nos seguintes eixos estruturantes: Investigação Científica, Processos Criativos, Mediação e Intervenção Sociocultural, Empreendedorismo, etc. Já a forma de sua exploração poderá ocorrer através, por exemplo, de disciplinas eletivas, de livre escolha do estudante, que, por sua vez, poderá diversificar a sua formação escolhendo temas do seu interesse, associados, ainda, a outras áreas do conhecimento.
Há alguns outros caminhos que a escola pode seguir para definir os seus Itinerários Formativos, porém, aqui, o mais importante é a escola ter claro qual será o perfil de saída dos seus alunos. Por exemplo, tratando-se de escola técnica, os Itinerários podem ter uma abordagem mais direta sobre o mundo do trabalho. De outro lado, se o perfil de saída dos alunos estiver ligado ao ingresso em uma faculdade, a escola poderá organizar estes Itinerários de forma a viabilizar o aprofundamento e revisão dos conteúdos referentes aos processos seletivos.
Mas é aconselhável, em qualquer caso, que a escola escute os seus alunos para, assim, criar propostas mais próximas à realidade e ao interesse deles.
Importante destacar, ainda, que no Novo Ensino Médio é obrigatório para as três séries a disciplina Projeto de Vida, em que os estudantes poderão refletir sobre como fazer as melhores escolhas para a sua vida. Nesta disciplina, o objetivo principal é o autoconhecimento e será, a partir desse processo, que o aluno fará as escolhas dos seus itinerários.
Não podemos nos esquecer que no Novo Ensino Médio o aluno deverá permanecer mais tempo na escola, considerando o aumento das horas anuais de oitocentas horas para mil horas – o que, certamente, implicará gastos adicionais, bem como alterações na logística escolar, devendo, tais fatos, serem contabilizados e administrados por seus gestores, objetivando a sua implantação com solidez.
Fato é que o Novo Ensino Médio trouxe a grande oportunidade do aluno dar vida prática à teoria de uma forma muito mais interessada, considerando a sua liberdade de escolha e o desejo de aprofundar ou praticar os seus conhecimentos.
Sem dúvida alguma, este novo modelo possibilita fazer da escola um espaço muito mais atrativo, já que permite ao aluno conhecer melhor as suas dificuldades e potencialidades, para que, no futuro, faça escolhas melhores para sua vida, dentre elas, a de permanecer na escola até a conclusão de seus estudos, contribuindo, assim, para a redução da taxa de evasão escolar mencionada no início deste artigo.
Por Francisco Clovis de Sousa Júnior
Francisco Clovis de Sousa Júnior é Bacharel em Física pela UNICAMP e Licenciado em Matemática. Professor de Física em Cursos Pré-vestibulares e em Escolas de Ensino Médio desde 1999. Atualmente é Coordenador do Ensino Médio do Colégio Imaculada Campinas e Imaculada Mogi Mirim.
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